Natal,
13 de Março de 2012
12h57min
37°C
E da fossa que eles submergiram,
restara apenas o emblemático odor feito de lembranças e esparmos adormecidos,
que ficara acompanhando os seus parcos passos desde aquele dia até o infinito
da eternidade de seus recém-completados vinte e dois anos.
Ela era como uma Lua que carregava o
inexorável karma de sempre se apaixonar
pelos Sóis que o Eclipses sempre
faziam cruzar por ela; fora assim desde o início da puberdade até o infinito da
eternidade de seus recém-completados vinte e dois anos.
Ele sofria por carregar consigo a
dor do nada; de fato, não era nenhum donzelão abobalhado, jamas se apaixonara
por ninguém, nunca tivera uma namorada, nunca tivera um emprego; apesar de ter
uma família, uma casa para morar, uma cama para dormir, uma mesa para tomar
café da manhã, almoçar e jantar, apesar de tudo isso, ele nunca tivera um lugar
que o permitisse chegar e dizer as palavrinhas magicamente regozijantes: “home sweet home”; fora
assim desde o início da puberdade até o infinito da eternidade de seus
recém-completados vinte e dois anos.
Ela, sim, sempre fora uma donzelona
abobalhada (claro que no bom sentido dessa tosca locução adjetiva), sempre se
contentara com as migalhas e esmolas que a vida lhe oferecera, sempre se
contentara com o absorvente mais barato mesmo que ele sempre a fizesse passar
vergonha, jamais se importara com o fato de ninguém nunca haver a chamado de
gostosa ou assoviado para ela (e olha que ela vivia passando em frente de
construções, e de quadras de futebol de salão amador). Entretanto, mesmo com
tudo isso, ela possuía em seu âmago um masoquista dispositivo que a preenchia
com uma sensação idiota de alegria eterna.
Ele passara a vida lendo livros de
literatura (sobretudo erótica, homoerótica e brasileira), de filosofia
(sobretudo Benjamim, Adorno, Kant, Foucault e Marx) e de Psicanálise (sobretudo
Freud, Lacan e aqueles livrinhos-resenhas daquela coleção da Imago).
Normalmente, ele costumava ler cinco livros ao mesmo tempo e dez livros por
mês.
Ela lia livros de horóscopo
(sobretudo João Bidu), de receitas (sobretudo Ana Maria Braga e Edu Guedes) e
de Autoajuda (sobretudo Augusto Curi, Pe. Marcelo Rossi e Pe. Fábio de Melo) .
Normalmente, ela não costuma ler, levava dois meses para ler cem páginas.
Ela está descendo do circular e
pisando em solo universitário pela primeira vez.
Ele está descendo do circular e
pisando em solo universitário pela enésima vez.
Ela roda igual a uma pomba-lesa
procurando o celular que sem perceber acabara de deixar cair.
Ele escorrega ao pisar em um celular
guitarrinha rosa, depois de apanhar o celular ele percebe uma garota de costas
para ele destroçando uma bolsa e deduz o óbvio.
Ela, ao encará-lo, acha que está
olhando para um Deus de tão lindo, mas mesmo assim como sempre se apaixona
perdidamente e chora por dentro com a certeza de que ele será apenas mais um
Sol que passará de carona neste Eclipse que está acontecendo agora nesse exato
momento.
Ele,
ao encará-la, percebe que está olhando para uma garota no mínimo estranha, mas
como que sem explicação sente um arrepio assim que seu coração dispara e parece
querer sair pela boca e pede ao Deus (que ele não acredita) que gostaria muito
que ela não fosse apenas mais um reflexo de nada que está a encandear os seus
agora nesse exato momento.